Marcus Brancaglione
5 min readApr 9, 2017

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De fato Francisco, há outras falhas e generalizações durante todo o livro que Gelderloos comente tentando provar o seu ponto de vista. Como você bem apontou ele o faz sem no final das contas estabelecer um contraponto suficiente de cases de sucesso da violência, ou sem perceber, quando o faz acaba por fazer a apologia de resultados aferidos pelo próprio monopólio da violência que ele mais condena: os Estados-Nações como é caso da intervenção dos mesmos contra o nazismo na Segunda Guerra.

Adianto que nos próximos capítulos. E especialmente no final, esses anacronismos vão ficando cada vez mais explícitos. Porém o mérito do texto de trazer para o plano do debate racional e crítico alguns dogmas tanto da pax estatal quanto da desobediência civil permanece ainda que a maioria dos argumentos seja superficial e fraco. Ele acaba por servir como provocação ou instigador para que ativismo social e políticos, repensem e revejam a efetividade das estratégias perante a atualidade e reflexão para o questionamento dos argumentos fortes de legitimação da violência que no fundo continuam pertencer ao Estado e a sua justiça.

Enfim é um autor que apresenta alguns argumentos razoáveis outros nem tanto e que no final das contas não produz uma tese solida de defesa do ativismo violência, e como ele mesmo assume no final (estou adiantando) de desqualificação da não-violência. Cometendo no meu entender erros ainda mais graves de entendimento quando por exemplo lida com a questão do holocausto, ao cai no lugar comum de culpabilizar as vitimas, utilizando o mesmo argumento nazi de que aquele que não oferece resistência violenta ao extermínio e dominação violente merece o destino da escravidão e holocausto. por isso a vida. Lógico que ele não faz isso para justificar seus crimes, mas para instigar a resistência. mas nesta tentativa confunde a omissão de quem assiste e ainda pode fazer algo, com a impotência de quem está a ser assassinado antes mesmo do golpe final por essa violência.

Mas tudo isso não anula o mérito diria colateral do livro: estabelecer questionamento importantes dos fundamentos da paz e não-violência que justificam a violência e demostrando que o mundo contemporâneo exige outras formas de ativismo mais elaboradas e propositivas com protagonismo emancipação da sociedade.

Como você disse é um livre instigante. Muito mais pelas questões e perguntas do que faz do que pelas respostas que fornece. Por exemplo ele conseguiu me deixar com a pulga atrás de orelha com uma coisa que pode ser fruto da minha ignorância, por simplesmente nunca ter passado pela minha cabela aventar tal hipótese de ação: os bombardeio dos campos-de-concentração. E estou “pesquisando”.

Eles sabiam destes campos, ou que acontecia neles? Quando exatamente se “descobriu” o holocausto e como? Ninguém desconfiava? Qual era o nível de informação proveniente de denuncias ou espionagem durante a guerra sobre o holocausto? É realmente possível um extermínio em massa desta dimensão passar desapercebido? Se não, considerando não os meus mais os valores humanitários e morais mas supondo os deles por seus comportamento. Como nos ataques nucleares de “Hiroshima e Nagasaki” usados para “acelerar o fim da guerra e justificados para “salvar” vidas, com o “sacrifício” de outras vidas. Observando exatamente essa lógica, me pergunto porque eles não bombardearem essas fábricas de assassinato? Ou mais precisamente porque certa ou errada, porque não usaram a mesma lógica para por fim ao holocausto que usaram para colocar fim a resistência do Estado Japonês?

A resposta de que ninguém é santo, não é suficiente. Seria completamente irrelevante do ponto de vista estratégico explodir essas campos de concentração? Não dá para afirmar que é mais seguro ser prisioneiro de guerra do que civil quando a correlação de forças muda, mas seria simplesmente isso: um dogma do pensamento militar assumir a responsabilidade por casualidades civis são aceitáveis, entre prisioneiros de guerra não?

Ou simplesmente não foi aventada tal hipótese por que a libertação dos judeus não era um objetivo de guerra, de tal modo que não havia nenhuma preocupação, plano ou medida a cerca dessa questão? Até que ponto o extermínio era completamente desconhecido e até que ponto foi tolerado. Ou mais precisamente até que ponto o desconhecimento ou desinteresse por tomar conhecimento constituíram tolerância. E depois, até que ponto o desinteresse ou omissão em tomar qualquer medida estiverem presentes neste crime contra a humanidade de forma muito mais relevante que a pobre e triste não-violência dos exterminados ou a resistência desesperada e por vezes sem nenhuma esperança senão de levar alguns inimigos consigo das resistências.

Realmente fiquei curioso se existem documentos do período ou teses publicadas a cerca de qual era o grau de conhecimento do holocausto e qual era os planos estratégicos (se haviam) de intervenção? Em que grau interessava ou desinteressava completamente para o bem e para o mal esse extermínio as demais nações aliadas. E por consequência de que forma as potencias lidam até hoje com os crimes contra a humanidade como no caso do ataque com armas químicas na Síria. Oportunismo, apoio velado, ou até mesmo como um jogo duplo bem mais complexo, onde o líder genocida Assad e os grupos terroristas opostos também não se tornam peça de tabuleiro das potencias nesse teatro de operações, peças a ser movimentadas ou mais precisamente deixadas a se movimentar livremente até que que eles possam o usar o rastro de cadáveres que esses maniacos produzem como a base ideológica de suas futuras alianças e disputas nos jogos de guerra da mais nova ordem mundial.

Enfim, é por isso que estou publicando Gederloos. Para questionar e levantar esse debate dos fundamentos da violência legal e ilegal como reação e até onde e como podemos prescindir dela; ou ainda o que precisamos fazer para não precisar de fato ou se livrar da mesmo; até que ponto isso é possível, realmente interessa ou por outro lado é ou deveria ser um imperativo urgente. Especialmente agora que a violência e sua apologia volta a ser banalizada em larga escala como ideologia e recurso, quero acender a discussão de em que bases podemos estabelecer uma resistência mais proativa seja tentante reverter esse processo, seja na sua inevitabilidade de impedir essa onda de como nos defender de preferencia preventiva e construtivamente contra ela. Enquanto ainda temos tempo e recursos e direitos sociais e doravante civis não completamente precarizados para tanto.

É isso, Francisco, agradeço profundamente o feedback sobre o livro.

Uma abraço para vocês e saudades

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Marcus Brancaglione

X-Textos: Não recomendado para menores de idade e adultos com baixa tolerância a contrariedade, críticas e decepções de expectativas. Contém spoilers da vida.