Brasil, o país do me engana que eu gosto

A ética das aparências ou a superficialidade da moral brasileira

Marcus Brancaglione
8 min readApr 12, 2017
Retrato de família da “Grande Família” brasileira

O desespero dos sem foro frente ao escarneio dos privilegiados escancara o contraste:

“a prisão de Dilma Rousseff poderia ser o test drive ideal para prender o ex-presidente Lula com condenação ou não.”- ex-assessor de Dilma

Enquanto os políticos sem foro e seus paus-mandados não conseguem mais disfarçar o temor frente a guilhotina de Curitiba, já fazendo analises de como capitalizar politicamente isso… quem irá primeiro, ou até mesmo ainda tentando desesperadamente se manter elegíveis, onde e como puderem, para ver se voltam a proteção da casa jurídica das cortes e palácios, reservada a aristocracia “eleita”.

Os que lá estão sob a guarda e vigilância das altas cortes, seguem com a mesma tranquilidade, despudor e escarnio dos que não tem dúvida de estão em posições altas demais para serem varridos por esse tsunami político.

“Quem não apareceu está sendo considerado desprestigiado”- congressista denunciado

Pode até ser que figuras como o dito cujo acima estejam avaliando mal a posição que ocupam dentro da hierarquia da sua organização criminosa para se sentir tão blindados assim. E pagem mais por causa da sua indiscrição do que pelos crimes propriamente ditos. Afinal a posição que ocupam é feita para proteger contra a falta de honestidade e caráter, mas não não contra esse tipo de falta de decoro que fere a verdadeira moral que rege a aristocracia político-criminosa: faça o que quiser, mas não alardei. Se quiser entrar ou permanecer para a classe é código entender o código de ética da famiglia: permanecer nas sombras, negar sempre e manter acima de tudo a imagem e as aparências da “instituição”.

Essa é a ética da amoralidade política. E assim o é, porque é o espelho da moral que governa a sociedade brasileira: a imagem e aparências. Não é a toa que tudo seja apenas uma fachada: das narrativas biografias, as narrativas jornalisticas ou institucionais, históricas e atuais. O verdadeiro Brasil não está maquiado, ele é uma maquiagem. Se você a removê-la simplesmente não há um rosto uma cara, um caráter. Só apenas olhos a olhar e julgar uns aos outros. Um país podre fora e oco por dentro. Sem conteúdo moral por que nossa moral não é corrupta, mas essencialmente nula, superficial, carente, desesperadamente vazia.

Mas voltemos esses olhos sedentos novamente para o baile de máscaras das cortes. Na lista de Fachin três 3 tipos de “personalidades” com fórum privilégiado: dois evidentes e o terceiro nas entrelinhas: o foro do que tem o privilégio de ficar nas altas cortes; os que não os tem, e os que não estão sequer nas listas e jamais aparecerão nelas, porque pertencem, são a própria altíssima corte. Estes gozam de um nível de privilegio ainda maior que o presidencial que é simples e descaradamente declarado inimputável. Eles para todos os efeitos práticos são tacitamente inimputáveis. Não precisam nem estar inscritos e expostos na lei para estar protegidos por seu poder de fato acima de qualquer representatividade, inclusive a sua.

Reveladora portanto mais da nossa moral do que da deles, é a colocação a seguir feita por um amigo criticando a tardia publicação da lista dos “investigados”:

“Agora? Depois de tudo? Se eles tivessem publicado isso antes de se queimarem, antes daquele episódio vergonhoso do Renan, não teriam perdido a credibilidade que tinham….” — amigo imaginário

Ele disse isso em tom de lamento. Lamentava pela imagem da instituição nacional ferida. Mas de que adianta a imagem limpa se o proceder de alcova é sujo? Não é muito melhor saber como e do que é feita o que você come? Do que chorar porque quem te engane foi pego?

O brasileiro é patético. Não chora por comer sem escolha lixo, chora por seus ídolos e campeões nacionais estatais ou privados, chora por “suas vergonhas”. Chora pela vergonha que passa perante seus senhores estrangeiros. E mais preocupado do que sua vida, está com a sua imagem internacional, frente a gringos que muitas tem o rabo tão ou mais sujo de merda e mãos ainda mais sujas de sangue mas que não fedem tanto porque perfumados e bem vestidos. Aliás corrijo o brasileiro, não. A sociedade brasileira, porque o povo está na senzala. É o preto da casa que chora quando o senhor e as visitas choram, e ri quando eles riem. É ele que acha que existe apenas para inglês ver. É essa burguesia de esquerda e direita: o cidadão de segunda classe e não o de terceira: o popular, o não-cidadão.

Não senhores, o problema da sociedade brasileira não é corrupção. Porque para se corromper é preciso ter alguma essência, algum valor próprio. O problema é o completo vazio deixado pela aculturação e alienação que produz esse vácuo moral e espiritual da sociedade que traga a tudo e todos para essa busca da felicidade idiota egoísta e superficial, desprovida de qualquer sentido de vida que não possa ser preenchido por um terno, um seriado ou um restaurante, e entre atos por algum guru “espiritual” ou hobby.

O topo pode ser feito de múmias e vampiros de almas podres mas seus séquitos não é feito senão de mortos-vivos, zumbis em suas bolhas. Uma mentalidade que mesmo quando complexa não passa de uma grande cebola que quando você descasca, não encontra nada além de camadas e mais camadas da mais superficialidade regidas pelo tempo e espaço do outro.

Logo, não deveríamos estar lamuriosos, pela lerdeza e estupidez da altas cortes. Por esses entes supremos não terem conseguido preservar sua imagem. Esse é de longe o maior legado da Lava-Jato. Mais outro ídolo, outra imagem, outra vaca sagrada caída e quebrada que deixa os fanáticos dos templos perdidos a procurar e perguntar chorosos “e agora, quem poderá nos defender com suas anteninhas de vinil?”

Me engana vai, me engana que eu gosto. Porque o que os olhos não vêem o coração não sente, principalmente quando esses olhos e corações e bocas já não nos pertencem. São orgãos retransmissores e repetidores de vontades outras que nem sequer conseguimos mais entender como distintas da nossa.

Buscamos felicidade como gordos buscam saciar sua fome atacando geladeiras. Para ver se depois de empanturrados nos esquecemos quem não somos e quem um dia queríamos ter sido, quando ainda eramos jovens e lutávamos para estar vivos. E não o retrato de retocado de nossa própria inexistência.

Mas não se preocupe com isso. Isso não é um problema seu, mas dos seus provedores de conteúdo e formadores de opinião e claro da industria do SEU entretenimento. Não é você, mas ele que tem se preocupar em como mantê-lo entretido enquanto o mundo gira. É o trabalho deles, não o seu, fabricar seus passatempos e ocupar o pouco tempo livre que lhe resta não tendo que um servo e escravo da vontade dos outros, com o desejo de sê-lo.

BBB? Não. Com notícias políticas e econômicas mesmo. Os BBBs de quem se acha bem formado e informado. da sua condição de mero espetador da sua vida pública e vigiado em sua vida privada. Porque a máxima permanece válida: enquanto você olha para o abismo, o abismo também olha para você. E sorri para você nesta grande casa-jogo de espelhos-brinquedos.

Então não lamente, agarre com todas as forças essa janela, essa chance de se libertar. Porque nisto somos privilégiados. Não é toda geração que teve tamanha oportunidade de ver a pequenez dos mágicos de Oz trabalhando por trás das cortinas.

O foro privilegiado como temos no Brasil só existe aqui. Nenhum país democrático do mundo tem a prerrogativa como nós temos. O foro privilegiado é um resquício aristocrático, só pertencente a monarquias absolutistas. E nem monarquias absolutistas têm foro para tanta gente. Temos foro para 33.387 pessoas. É do presidente da República aos prefeitos, passando pelo vice-presidente da República, ministros de Estado, comandantes das Forças Armadas, chefes em missões diplomáticas, governadores e vices, secretários de estado e do Distrito Federal, ministros do Supremo Tribunal Federal, dos tribunais superiores, senadores, deputados federais e estaduais, membros do TCU, membros dos tribunais de contas estaduais. Nenhum local do mundo tem isso. Nos Estados Unidos, não tem para ninguém, nem para o presidente da República. Na Grã-Bretanha, só existe para a rainha. Na França, não existe. É incompatível com uma democracia a existência desse instituto. Só serve para abarrotar tribunais e proteger alguns. — de um congressista anormal representante do desvio padrão da sociedade brasileira

Por isso no que concerne a questão de quem será preso, quando e em que ordem vejo o seguinte:

Se a Lava-Jato continuar a demostrar a mesma noção de política que tem apresentado até agora, não fará a prisão de nenhum peixe grande decaído, como Lula ou Dilma sozinhos, mas numa grande operação que atinja a todos, num grande pacote com peixes grandes dos mais variados partidos, de modo a minimizar o uso como argumento de defesa ou propaganda política por qualquer um deles. Se errarem e procederem de outra forma a noticia será a grand finale da Lava-Jato, mas a prisão exclusiva naquele momento daquele grande líder. Porque no final das contas é nisso que a coisa toda vai se resumir na sociedade do espetáculo: imagens. Como a imagem dos personagens será trabalhada para cada público cativo. E portanto qual é a margem de manobra que cada grupo em disputa terá para produzi-la e vendê-la como “opinião” prefabricada.

Neste jogo de aparências não é só a ordem dos fatores que altera o produto, mas a qualidade dos “fatores” dividindo o resultado na mesma equação.

Porque o essencial, bem o essencial, onde ele ainda vive continuará por natureza invisível aos olhos. E por definição fora desse mundo prefabricado de fachadas e slogans, títulos e superficialidades. Continuará parecendo nada para os espantalhos, homens de lata e leões covardes…

E você Dorothy o que você quer em do seu Mágico de Oz?

O “grande filósofo” contemporâneo da “brasilidade”, “Capitão Nascimento”, estava errado: o inimigo agora não é outro… ele sempre foi outro, sempre esteve com você…andando com em você, acima de você… zelando pelo seu bem enquanto você vê apenas o mal no outro. Agora mesmo ele está aí e aqui em mim em você… no ar…

tiiiime is my on side (yes it is)…

Anjos e demônios… salvadores e bestas… em essência são todos são feitos da mesma matéria… sem alma. E a persona que é o deus para uns é o diabo de outros. Uma das muitas máscaras do mesmo espírito atemporal… das muitas faces do mesmo senhor da discórdia.
I see a red door and I want it painted black/No colors anymore I want them to turn black/I see the girls walk by dressed in their summer clothes/I have to turn my head until my darkness goes/I wanna see it painted, painted black/Black as night, black as coalI wanna see the sun blotted out from the sky/I wanna see it painted, painted, painted, painted black -Rolling Stones

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Marcus Brancaglione

X-Textos: Não recomendado para menores de idade e adultos com baixa tolerância a contrariedade, críticas e decepções de expectativas. Contém spoilers da vida.