Aborto : Você é contra ou a favor?

Da certeza do direito a vida (e a morte) sem o questionamento sobre jurisdição sobre a vida e morte alheia

Marcus Brancaglione
14 min readDec 4, 2016

O Aborto: você é contra ou a favor? Eis uma pergunta que ninguém que deseja ser justo deveria tentar responder sem primeiro se fazer outra: sou eu que devo decidir?

Antes do mérito da questão, há que se definir a quem pertence o mérito da decisão. E não é dos meritíssimos, mas da mulher, não como um coletivo, mas dela, única e exclusivamente dela, como gestante.

Então sou a favor do aborto? não, eu sou contra. Mas sou a favor da sua descriminalização. Tal resposta pode soar contraditória. Uma fuga demagógica da pergunta. Mas isso só porque nossa mente está completamente imersa no paradigma autoritário.

Na verdade não apenas sou só a favor da sua descriminalização, mas absolutamente contra qualquer prerrogativa de criminalização ou suposição de jurisdição de terceiros sobre esse processo gestacional que lhe é completamente alheio. Não me considero senhor e juiz, não me considero absolutamente com nenhum direito, legitimidade ou prerrogativa para intervir nesse processo conceptivo e relação gestacional, e de fato não vejo nenhuma outra pessoa com autoridade para intervir, permitir ou proibir, tal intervenção que senão a autoridade absoluta e individual da mulher sobre ela mesma.

Não estou afirmando com isso que o feto de um ser humano não tenha diretos e que não deva ser protegidos. Muito pelo contrário. Defendo que ele enquanto estiver naturalmente ligado a mulher de forma, literalmente, umbilical, está por extensão protegido pelo mesmos direitos que ela. Estão ambos amparados nos mesmos direitos universais, naturais e humanos, que exigem que toda sociedade as protejam contra qualquer violência contra a gestação. E assim como a inseminação forçada, e gestação forçadas são (ou deveriam ser) considerados formas de estupro. A interrupção igualmente forçada contra a vontade da mãe da gestação, constitui tanto agressão contra ela, como assassinato contra o feto.

Não estou portanto negando o direito à vida, estou assumindo a minha responsabilidade naquilo que compete ao direito de atuação da minha pessoa não violar e proteger.

A concepção, a gestação é um fenômeno sagrado. Mas cujo sacralidade, por mais que o pátrio-poder inveje e odeie, não pertence ao homem e seu culto a sua persona como “vontade coletiva”; e sim pertence a pessoa natural, livre e consciente da mulher. A única pessoa que poderia exigir que a mulher responda pelos atos cometidos nessa relação concepcional é ela mesma ou o filho que nunca teve. E isso está completamente fora do nosso plano. Porém quem não compreende a extensão psicológica e espiritual de tamanha responsabilidade que essa projeção representa perante a si mesmo e a vida, não só não tem capacidade de conceber, como não faz a menor ideia do que é a concepção ou geração da vida.

“Como assim? Como pode ser o aborto feito contra ou a revelia da vontade da mãe um assassinato. E o aborto feito com seu expresso consentimento não? Isso não é uma eutanásia. O feto e mãe não são uma mesma pessoa”. De fato não são. De fato a vida da mãe e do feto não são relativas e nem uma só. E por isso quem as viola ou mata uma mãe grávida, mesmo sem a intenção de matar o feto, não mata uma pessoa mas duas pessoas; pode e deve ser responsabilizado por isso.

Elas, feto e mulher não são uma vida, mas duas. Porém completamente unidas dentro do corpo da mulher que é a única que tem autoridade legitima para decidir o que se faz neste universo que lhe pertence. O corpo da mulher não é um território, não é um receptáculo, nem pode ser reduzida a tal condição, ela antes de ser mulher é uma pessoa, e como toda pessoa dotada de consciência soberana sobre seu universo. Na verdade nenhuma pessoa é só um corpo e não importa quantas almas um corpo carregue, o corpo pertence absoluta e exclusivamente a anima que lhe dá vida. Por isso, não pode a pessoa ser obrigada a se sustentar nem mesmo a si mesma, se assim não for mais sua livre vontade, quanto mais as demais animas que dependem dela. Porque a substração dessa livre vontade já é o assassinato dessa forma de vida.

A relação da mulher com seu futuro filho, a relação gestacional é fenômeno próprio constituinte de um organismo real, e não de uma abstração moral ou preconceito do juízo dos homens. A mulher, tem de fato o poder sobre a gestação que o pátrio-poder jamais terá nem de fato nem de direito sobre nada. Ela tem o poder que os legisladores e governantes sonham e desejam ter sobre os outros homens dentro dos seus estados, mas não conseguem possuir senão com violação, violência e destruição. O poder delas é natural, é inerente a sua forma de vida, é liberdade; o deles é anti-natural, anti-libertário e completamente estranho e contrário a própria vida como ela é: o fenômeno da materialização inteligente da liberdade.

Em nossas sociedades estadistas e patriarcais, quando você responde que é a favor do aborto automaticamente nossa mentalidade autoritária responde por pressuposição julgando que então você aceita o assassinato dos fetos em favor da inviolabilidade do corpo da mulher. Respondemos condicionadamente sem sequer nos lembrar de fazer a pergunta mais tão importante: quem tem a prerrogativa para definir o que é a vida? Quem tem a autoridade para agir sobre essas vidas? De quem é o direito sobre a vida e morte? Ou, o que é a mesma coisa, quem tem direito de intervenção sobre as liberdade pessoais? Enfim, de quem é o poder e a jurisdição sobre o direito vida, morte e liberdade alheia?

Nascemos dentro de um arcabouço autoritário e hierarquista de pensamento, ou mais precisamente de pensar reduzido a julgamento. Nossa mente funciona como um juri de um tribunal, e aquilo que julgamos por direito é a base para julgar a culpa ou inocência do outro, e demandar - seja como pedido ou exigência- que um poder maior ou supremo interceda para a execução da nossa sentença.

E não só não questionamos a autoridade suprema dos nosso juízes executores e legisladores, como não questionamos sequer quais são os limites do nosso poder de decisão uns sobre os outros, ou sobre a natureza ou qualquer outra forma de vida. Por isso cada povo tem o governo que merece. E nós que somos tiranos e cultuamos e adoramos o poder e a força, nos entregamos facilmente a qualquer tiranos que tenham mais poder e força maior que a nossa.

A pergunta portanto que devemos nos fazer, principalmente nós homens , é que direito temos não apenas sobre o corpo da mulher, mas sobre o processo gestacional. Nada impede de formarmos nosso juízo, sobre o aborto; se somos contra ou favor, o aborto… mas a questão primordial não é o que achamos, mas o que consideramos como nosso direito de intervenção, para poder fazer prevalecer nosso juízo? Ou mais precisamente, até onde vai nosso direito ou mesmo dever humanitário de intervir?E o mais importante de tudo, em que termos esse direito ou dever se configura e logo deve estar disposto? como punição? criminalização? Ou incentivo e proteção a vida?

Perguntar portanto se somos a favor ou contra o aborto pressupondo que com isso temos automaticamente o direito de intervir, punir a mãe, é algo que só é possível, porque em sociedades autoritárias e estadistas não questionamos direito ou o dever de intervenção. Não questionamos quem, quando nem muito menos como podemos intervir, nem muito menos quem, quando e como temos obrigação de interceder.

O aborto é uma questão complexa, porque contrapõe dois direitos fundamentais: o direito a vida do feto e liberdade da mulher. Parece um conflito reduzido apenas ao julgamento se a inviolabilidade do corpo e da liberdade da mulher permite que se interrompa a gestação, se isso é, ou a partir de qual momento é um assassinato. Ou se sendo ou não, em quais circunstâncias seria aceitável permitir isso: estupro, gestação de risco para a mãe ou a criança, problemas graves de saúde, ou simplesmente uma gravidez indesejada.

Como disse, eu tenho opinião formada sobre cada um dos quesitos por mim elencados. Mas essa não é a questão, minha opinião não interessa. Interessa a da mãe, é dela o poder e somente dela o poder de decisão sobre o ato que ela irá cometer. Por acima de tudo, se não somos absolutamente hipócritas é sobretudo nela, no corpo, sua vida e alma que se carregará as consequências desse ato, e não nas nossas presunções de moralidade. Não é uma questão de permitir ou não. O aborto é antes de tudo uma questão de definição e reconhecimento dos limites dos poderes de interferência de uma pessoa na vida da outra, não importa o quanto ela faça o revolte, e se essa revolta seja justa ou não.

Isso aos ouvidos de pessoas doutrinadas a mandar e obedecer soa como um sacrilégio. Mas a verdade é que não somos deuses, temos sim a obrigação humanitária de fazer tudo o que pudermos para ajudarmos nossos semelhantes, temos o direito a legítima defesa e com base nele podemos intervir para deter uma violência flagrante. Mas não podemos fazer nada disso cometendo mais violência.

Isso implica portanto que a interrupção gestacional feita pela própria mãe ou consentimento expresso dela não é passível de criminalização por terceiros, mas qualquer aborto feito a qualquer momento da gestação contra a vontade da mãe, é crime de assassinato contra a criança e violação do corpo e liberdade da mulher.

Não estou afirmando cientificamente que a criança e feto formam uma persona por ela estar em seu corpo. Estou afirmando que esse conhecimento é irrelevante para a tomada de decisão. Pelo simples fato que o conhecimento, mesmo quando verdadeiro, não implica em poderes e autoridades sobre os demais. Mesmo que fossemos deuses ou seres oniscientes, não teríamos o direito de ser onipotentes, principalmente se a nossa potencia representasse violação da vida e liberdade alheia.

O fato da mulher pode conceber, não implica em nenhuma obrigação de fazê-lo ou manter o processo de concepção contra sua vontade! Seja da cópula, a gestação qualquer parte desse processo da concepção contra sua vontade é o mesmo crime; e não é porque consentiu em uma parte dele, ou em dado momento que se infere que ela tenha consentido automaticamente com as demais, ou sua continuidade sem permissão, ou tenha renunciado ao seu poder de interromper esse ato ou processo!!! Enquanto a vida da criança não for autônoma, isto é enquanto ela não puder viver sem a gestante ou fora do corpo da mãe, é somente dela e de mais ninguém as decisões sobre essa gestação.

Porém no exato instante que a vida da criança poderia continuar existindo, sem a mãe, qualquer ato dela, seja de agressão ou mesmo de omissão em relação aos seus direitos a vida, é exatamente o mesmo crime de violência contra qualquer outra pessoa.

O direito ou até mesmo obrigação social ou humanitária de intervir em favor da vida em liberdade, é regido pelo mesmo principio das relação sem violência entre seres livres, ou seja, pelo absoluto respeito a autonomia e a consensualidade. E qualquer pretensão de ajuda, salvação, libertação, justiça, que se faça violando esse direito é o oposto do que se afirma fazer.

A vida não é uma abstração ou uma objeção de conceituação alheia. É um fenômeno gerador de entes autônomos por entes autônomos. A gestação, a união do corpo e alma da mãe e criança não é uma abstração ou objeto, se constitui como fenômeno autônomo sob o qual ninguém mais tem jurisdição sobre ele, senão a gestante. Mesmo a pai não tem absolutamente nenhum direito de intervenção ou jurisdição sobre a futura criança durante esse processo de gestação, mas tão após o nascimento. Aliás, direitos não. Deveres, assim como a mãe.

Repito: no exato instante que a vida da criança poderia continuar existindo sem a mãe, ela e pai estarão sujeitos as mesmas sansões e responsabilidades que qualquer outra pessoa.

Mas e se mãe e pai não quiserem assumir sua responsabilidade? Se ela não quiser fazê-lo? O que faremos? Vamos prendê-la? Puni-la? Obriga-la sobre essa ameaça a “cuidar da criança”? Estamos realmente preocupados com o quê? Com o destino da criança? E quanto a nós, o que faremos? Ou melhor, o que realmente temos o direito e a obrigação de fazer?

É mais do que evidente que os pais não tem direito de vida e morte sobre os filhos, pelo contrário, são tem sim responsabilidade de provê-los e protegê-los. Porém se nos julgamos uma sociedade justa com o direito de intervir para impor sanções contra os pais que não cumprem seus deveres, é porque também assumimos igualmente o dever de proteger a criança. É sua proteção o objetivo da nossa ação e não a punição.

De fato, a única razão que permite a estranhos intervir contra a violência e omissão dos pais contra seus filhos é o fato deles assumirem voluntária e conscientemente também sua obrigação humanitária como seu dever social de provisão e proteção de toda criança. A mesma razão que obriga os pais a cuidar e proteger os filhos é aquela que obriga qualquer um que se arrogue da prerrogativa de interceder em favor da criança a assumir na medida da sua capacidade tal poder como sua co-responsabilidade. A não ser é claro, que sejamos só um bando de tiranos e covardes unidos, com justiça, não podemos nos arrogar o direito de intervenção contra a violência a outros, sem simultaneamente assumir tanto a corresponsabilidade pelas consequências dessa intervenção quanto a corresponsabilidade da eventual omissão.

Mas de novo, e se a sociedade não quiser fazer isso? E se a sociedade também não quiser fazer nada? E se ninguém quiser cumprir sua parte? O que faremos? Jogaremos toda a humanidade numa prisão? Colocaremos a nós mesmos numa prisão e jogaremos a chave fora? Ou vamos eleger um Grande Líder e fingir que ele é perfeito? Pedir para ele nos prender, e jogar a chave fora?

Por não querermos assumir nenhuma responsabilidade, vamos nos entregar eternamente a autoridade de alguma figura paterna? Divina ou mundana? E se essa fraude que inventamos para assumir nossas responsabilidades também obviamente não cumprir essa tarefa que ela não vai cumprir porque lhe é estranha, alheia e impossível -pelo simples fato que não pertence a ela, nem é do interesse ela- e aí? O que vamos fazer prendê-la e rezar por uma nova?

Onde eu quero chegar com isso? Que não podemos fazer nada pelo direito a vida do feto, da mãe, da gestação, ou da liberdade das pessoas. Não. Estou querendo chegar na conclusão radicalmente oposta: Se temos, (e temos) a humanitária obrigação de fazer algo; se somos e nos achamos conscientes e responsáveis pela preservação da vida alheia; se estamos mesmo tão preocupados assim com as crianças que não vão sobreviver; então devemos de fato nos preocupar em agir sobre as nossas faltas antes de tentar responsabilizar ou julgar, sem nenhum direito de fazê-lo; quem quer que seja.

Como eu disse no principio deste texto em sou pró-vida. Nada do que eu disse aqui, implica que não possamos assumir nenhuma posição de ativa de defesa da vida e liberdade. Quer dizer que só podemos fazê-lo legitimamente dentro dos limites da justiça, isto é, da não-violência e contra-violência, e especialmente com inteligencia e solidariedade. Precisamos aprender a evitar o problema e não só a lidar e reagir a ele. Precisamos agir proativamente para evitar que as condições que possam levar desde a gravidez indesejada até o aborto que poderia ser evitado se tornem uma opção. Na verdade podemos e devemos fazer muito mais: devemos prover as condições necessárias para que nenhuma criança ou feto morra, para que nenhuma gestação seja de risco, para que nenhuma criança já nasça com sequelas de gestação sem o mínimo vital, que nenhuma pessoa nasça como se a vida fosse uma condenação pelos crimes que não cometeu por simplesmente não ter o básico do básico para crescer em plenitude e segurança.

Se realmente nos importamos com a vida das crianças, inclusive aquelas que ainda estão em gestação, deveríamos estar menos preocupados em punir os pais e mães que não provem seus filhos, e ao invés de arrogar o direito de intervir com violência para violar liberdades e corpos, passar a garantir que todos tenham como preservá-los e sustentá-los independentemente. Garanto para vocês que muito mais omissos que os pais que estão vendo seus filhos morrerem de fome na Síria, ou outras periferias violentadas do mundo somos nós; nós somos os omissos e cúmplices dos verdadeiros assassinados de pais, mães e filhos, já que bancamos com nosso trabalho, impostos e obediência civil a privação e agressão que muitos em breve verão só como omissão deles.

Mas não precisamos ser tão radicais, nem enfrentarmos o mundo para fazer algo. Podemos fazer como, por exemplo, o que a assembleia da comunidade de Quatinga Velho me ensinou, quando decidiu que uma gestante do seu nono filho deveria começar a receber uma renda básica desde os primeiros meses de gestação.

Não há absolutamente nada mais absurdo e hipócrita do que nossas sociedades que se julgam no direito de criminalizar o aborto; de tomar para si o pátrio-poder de decidir sobre as gestações humanas, mas ao mesmo tempo não provém sequer o necessário nem para as crianças sobreviverem. Que compaixão escravagista é essa que não permite que a mulher interrompa a gestação, mas não se importa se ela ou a criança morrerão de inanição, ou doenças e tragédias facilmente evitáveis? Isso não é compaixão é perversão. Não é justiça, é sadismo.

Por isso faço questão de repetir: não conheço nem reconheço nenhuma entidade nesse plano material com autoridade superior para julgar uma mãe, nem conheço nem reconheço nenhuma fé, ciência, ou direito que tenha legitimidade para intervir no processo de gestação sem o consentimento expresso da mãe.

Reconheço sim o dever humanitário de intervir para frear todos os crimes que pudermos, mas na exata capacidade de fazê-lo sem cometermos crimes ainda maiores. E dos crimes que conheço e reconheço nesse mundo fora a agressão contra a vida cometida por assassinos e genocidas, o pior crime é o da privação das pessoas. A agressão da carestia. Crime este cometido pelos mesmos bandidos possessivos. E que não ocorre sem a nossa omissão.

Logo se os governos estão preocupados com a perda dos seus pagadores de impostos. As igrejas com a perda dos seus fiéis. As industrias a sua mão-de-obra semi-escrava, e os mercado seus clientes e consumidores, que deixem de ser hipócritas e passem a bancar seus interesses particulares e não tentar forçar como violadores tudo o que querem, como se fosse a vontade de todos ou pior, como se fosse lei.

Por isso, mesmo que fossemos a civilização mais avançada do universo e tivéssemos tecnologia para remover esse feto e gestá-lo a revelia da mãe que não quer tê-lo, mesmo assim só poderíamos fazê-lo se isso não fosse uma violação da mulher, e do fenômeno gestacional, o que por definição é, porque a relação deles está fora da nosso poder, nela eles são um só.

Mesmo que pudéssemos controlar mentes para obrigar as pessoas a fazer o que queremos e achamos certo, isso não seria a preservação da vida, mas a sua definitiva incompreensão, redução e morte. Seriamos a civilização só de homens que os supremacistas sonham ser, violadores e colecionadores, fazendo de o que pudessem alcançar a imagem e semelhança da sua própria morte em vida.

Mesmo que um dia fossemos uma civilização extremamente avançada e tivéssemos uma humanidade ainda mais consciente; e pudéssemos viajar pelos espaço conhecendo outros povos e humanidades em diferentes estágios de desenvolvimento tecnológico, consciência e civilização. Por mais absurdos que fossem os erros e até mesmo violências que eles cometessem uns contra os outros não pertenceria a nós o direito de intervir contra nem a favor de ninguém, não importa o quão errado ou certo este ou aquele estivessem. Poderíamos apenas intervir para ajudar a todos, porém sem jamais tomar parte desse processo, ou apartá-los ainda que para seu próprio bem, porque isso não seria ajudar, mas interromper autoritariamente o desenvolvimento e evolução da vida que não nos pertence; seria roubar-lhes o próprio direito de autodeterminação que os constitui como seres vivos distintos de nós, roubar seu livre-arbítrio.

Na verdade a educação, emancipação e evolução, se fundam na observância do mesmo principio libertário: a liberdade como livre-arbítrio que está acima de qualquer julgamento moral do bem e do mal, pelo fato de ser a liberdade a fonte geradora deste toda possibilidade moral. Logo, a ordem autoritária que tenta inverter essa ordem natural não promove o bem, mata a vida. Não se pode fazer o que se julga certo, matando a livre a vontade. Porque sem livre vontade não há mais certo ou errado, apenas poder que se plenamente perfeito em si mesmo, absoluto sobre tudo se nulificará e desfará toda a existência naquilo que o poder supremo é e vem a ser: o absolutamente nada.

Não adianta tentar preservar a vida subtraindo liberdades porque a vida é um fenômeno libertário. Se você encaixotar Helena você não estará salvado ela do mundo, nem o mundo dela. Você estará matando os dois. Todo nosso direito a força termina na resistência a violência, e não há nada que justifique a contra-violência senão a sua própria extinção. Mas quem ainda sim, se achar um deus todo poderoso ou o seu procurador aqui na Terra que atire a primeira pedra.

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Marcus Brancaglione

X-Textos: Não recomendado para menores de idade e adultos com baixa tolerância a contrariedade, críticas e decepções de expectativas. Contém spoilers da vida.